Administrar um município pequeno, pode ser simples, porém, complexo.

GRACILIANO RAMOS, O PAI DA RESPONSABILIDADE FISCAL.
Muito se fala em relação a administrar uma cidade. Uns defendem que a pessoa seja mais técnica enquanto outros preferem o lado político de governar.

Tem quem defenda que ir à faculdade, estudar anos seja a solução para o sucesso administrativo da população, enquanto outros acreditam que a melhor solução é se infiltrar no meio do povo, aprender seus costumes e por em prática seus anseios e desejos.
Um município do porte de Santana do Ipanema, com uma média de 45 mil habitantes, onde a maioria da sua população reside na zona urbana, mas os costumes e tradições estão bem arraigados ao meio rural, precisa ser administrado com sabedoria e boa vontade. O fato de esta maioria ter vindo de lá em busca de novos horizontes tem dificultado sua adaptação no dia a dia, como moradia, o trânsito caótico e o desemprego, só para citar alguns.
Talvez o fator mais difícil para que um administrador interiorano esteja em harmonia com seu povo seja o individualismo, isso porque a proximidade dos munícipes é bem diferente em relação a uma metrópole. Deixar, o máximo possível, as questões pessoais de lado para pensar no coletivo pode se tornar uma batalha diária.
Se para muitos essa é uma tarefa difícil ou até impossível quero citar um exemplo de administração pública ocorrida na década de 30, na nossa vizinha Palmeira dos índios. O então prefeito e renomado escritor brasileiro Graciliano Ramos deixou um exemplo de como é complexo administrar uma pequena cidade, ainda mais com parcos recursos. Mas Graciliano também mostrou que pode ser fácil, desde que o gestor possua, pelo menos, um pouco de coragem e boa vontade.
De acordo com os relatórios (Parte 1 e Parte 2)enviados ao governador do Estado de Alagoas, na época em que foi prefeito, Graciliano fala das dificuldades encontradas naquele município e das soluções que buscou tomar para dar uma melhor condição de vida à população.
Pra começar, Graciliano fala das despesas e dos poucos recursos deixados pelo seu antecessor e da dificuldade em gerir o Município, especialmente pela desorganização administrativa: “Havia em Palmeira dos índios inúmeros prefeitos: os cobradores de impostos, o Comandante de Destacamento e outros que desejassem administrar”.
Observando este relato do “Velho Graça” não é difícil identificar alguns desses problemas nos dias de hoje, em municípios do porte do nosso. Onde, muitas vezes, a falta de pulso se instala e a administração se esfacela, criando vários víeis, onde o comandante, em muitos casos se entrega a desordem generalizada, e o caos administrativo prevalece.
O então prefeito de Palmeira dos índios fala de duas situações de dificuldade: dentro e fora da prefeitura. “Encontrei obstáculos dentro da Prefeitura e fora dela”. E faz uma observação interessante, comparando as duas situações: “dentro uma resistência mole, suave, de algodão em rama; fora uma campanha sorna, oblíqua, carregada de bílis”.
Para quem quer lidar com pequenas “cobrinhas”, Graciliano dá um conselho, em forma de exemplo: “Dos funcionários que encontrei em janeiro do ano passado restam poucos; saíram os que faziam política e os que não faziam coisa nenhuma. Os atuais não se metem onde não são necessários, cumprem as suas obrigações e, sobretudo, não se enganam em contas”.
Um ano após tomar posse o prefeito fala de como estão: receita e despesa. Diz em relato: “A receita, orçada em um determinado valor, subiu, apesar de o ano ter sido péssimo, quase o dobro, que não foram bem aplicados por dois motivos: porque não me gabo de empregar dinheiro com inteligência e porque fiz despesas que não faria se elas não estivessem determinadas no orçamento”.
Graciliano fala ainda de pequenos detalhes, que para muitos passam despercebidos, tais como a compra de pequenos utensílios: pás, picaretas, enxadas, martelos, aço para brocas, alavancas, bem como reparos em logradouros públicos, como o muro da prefeitura e o a reforma do açougue.
São nos pequenos detalhes que o prefeito chama a atenção para a corrupção usada por alguns negociantes. “Houve despesas eventuais: feito o comércio de medidas, materiais para aferição, placas”. No relato, o detalhe da cultura do “levar vantagem em tudo”, o que para alguns pode ser chamado de “esperteza”. “Os litros aqui tinham mil e quatrocentos gramas. Em algumas aldeias subiam, em outras desciam. Os negociantes de cal usavam caixões de querosene e caixões de sabão, a que arrancavam tábuas, para enganar o comprador. Fui descaradamente roubado em compras de cal para os trabalhos públicos”.
Naquela época, assim como hoje, já se deixava que animais transitassem livremente pelas ruas da cidade, sem que alguma autoridade tomasse uma providência. Com isso o prefeito tomou uma decisão não muito popular. Com algumas lamúrias, reclamações e até ameaças de fazendeiros mandou tirar os bichos que eram criados nas praças.
Por essas atitudes, Graciliano foi construindo inimigos. Por mais que tentasse administrar o município ele era criticado. Fosse qual fosse a ação tinha quem lhe censurasse. “Certos indivíduos, não sei por que, imaginam que devem ser consultados; outros se julgam autoridade bastante para dizer aos contribuintes que não paguem impostos”.
“Há quem ache ruim em tudo, e ria constrangidamente, e escreva cartas anônimas, e adoeça, e se morda por não ver a infalível maroteirazinha, a abençoada canalhice, preciosa para quem a pratique, mais preciosa ainda para os que dela se servem. Há quem não entenda que um ato administrativo seja isento de lucro pessoal”.
Graciliano nasceu em Quebrangulo, mas, somente conheceu a fama, quando se mudou para Palmeira dos Índios, onde chegou a ser prefeito. Quer saber um pouco mais da história deste quebrangulense? Visite a Casa Museu Graciliano na cidade de Palmeira dos Índios, agreste de Alagoas.
                                       

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