OS CANGACEIROS, AS MULHERES, LAMPIÃO E A HISTÓRIA QUE O POVO CONTA

Cangaceiros 

Buscando histórias do Cangaço
A história dá conta de Basílio Quidute de Souza Ferraz como primeiro cangaceiro, autodenominado bispo de Lorena. Depois, José Gomes, o Cabeleira. Joaquim Gomes, o pai, e o negro Theodósio, formaram um grupo apreciado e temido pela população da caatinga de Pernambuco. Os três, capturados por militares, foram enforcados em Recife; em 1876.

Em seguida foi a vez de Manoel Batista de Morais se tornar famoso como Antônio Silvino; tão famoso, posto que também era chamado de Rei do Cangaço, Rifle de Ouro e Governador do Sertão. Jurou vingar a morte do pai, e juntou-se ao bando de Luís Mansidão. 
Pouco se diz que a violência dos jagunços, a mando de portugueses donos de terras, fora a parideira do cangaço; violência entre famílias rivais abocanhando terras. Os jagunços se alugavam em troca de comida, de dormida.

Antônio Silvino errou absoluto pelo sertão, por quinze anos. Propôs ao governo do Rio Grande do Norte, deixar a vida de erradio em troca da anistia. Com a recusa, foi preso em 1918. Condenado a vinte anos de cadeia, foi indultado por Getúlio Vargas em 1937. Tornou-se funcionário público no Paraná. Na prisão, aderira à religião batista, abjurando o cangaço. Morreu em Campina Grande, em 1944.


O chefe de polícia Ulysses Gerson Alves da Costa escreveu em relatório de 1908, referindo-se a Silvino: “Essas populações criam toda a espécie de obstáculos à ação da polícia, negando esclarecimento aos comandantes das forças e facilitando a fuga dos bandidos”.

A trilha foi seguida pelos grupos de Sebastião Pereira e Praxedes. Em 1917, tocaram fogo em propriedades, arrebataram bichos e mataram gente no município de Malhados. Na seca de 1919, Jatobá de Tacaratu, Águas Belas e Ipanema foram atacadas pelo grupo dos irmãos Porcino – Manoel Antônio e Pedro – e de Antônio Germano.

A pedra da Emboscada na zona rural de Serra Talhada
A família de José Ferreira da Silva, pai de Lampião, vendera a fazenda em Vila Bela e se mudara para Nazaré. Por motivo de roubo de gado. O vizinho, José Saturnino, não manteve a palavra de ficar longe dos Ferreira. Houve troca de tiros. A casa de José Ferreira foi cercada por quinze homens. Virgulino e o tio, Manoel Lopes, reagiram com tiros.

Depois disso, toda a família passou a andar com armas de fogo e punhais, afora as roupas de couro e chapéus de abas largas. Coincidiu de, na época, Sinhô Pereira e Luís Padre errarem por Pernambuco, Paraíba, Ceará e Alagoas. Por razões de vinganças familiares.

No ataque a Nazaré, Virgulino e seus dois irmãos – Levino e Antônio – aderem a Sinhô Pereira. A polícia ataca a posse da família. Levino é preso. José Ferreira compromete-se a deixar a região se o filho for solto. Vão para Águas Belas, Alagoas. ; perdem o gado, ficam pobres.

Ruínas da casa de Zé Saturnino, inimigo de Lampião
As terras de José Saturnino são atacadas em 1920. João, outro filho de José Ferreira, é preso. Lampião ameaça tocar fogo na cidade se o irmão não for solto. A polícia solta João. O pai é morto no ano seguinte. Definitivamente no cangaço, Lampião ganha o apelido por dar tiros rápidos e seguidos, encandeando a noite. 
Herda de Antônio Silvino o ofício da agiotagem, com o dinheiro extorquido de fazendeiros ou mediante sequestro de políticos e de gente influente. Labareda, que pertencera ao grupo, diz à polícia que o chefe mandava o intermediário cobrar as “notas promissórias”, e dizer ao devedor que “não se confie por estar na cidade grande, porque ele tem quem venha lhe arrancar um olho e levar para guardar no bornal...”*

Antes de se estabelecer com Luís Padre em Minas Gerais como criadores de gado, Sinhô Pereira pede a Lampião que mate o derradeiro dos assassinos de seu irmão, uma pessoa da família Carvalho. Coincide que Lampião também tem os Carvalho como inimigos.

Lampião apeia em Triunfo com o apoio do prefeito e do vigário.

Sérgio Loreto, governador de Pernambuco, confessa ser difícil capturar os cangaceiros, “especialmente os de Lampião”, por terem a cumplicidade dos habitantes. O bando atua em Arcoverde – Rio Branco -, Ipanema, Moxotó, Pajeú, Navio e Brígida.

Estácio Coimbra, governador seguinte, nomeia Eurico de Souza Leão, chefe de polícia. São criadas as volantes – perseguição apenas de cangaceiros. Usam alpargatas de rabicho, as mesmas do cangaço.

*História do Cangaço – Maria Isaura Pereira de Queiroz

Cangaceiros II

Por influência de padre Cícero, Sinhô Pereira e Luís Padre vão para Minas Gerais. A mesma influência faz Lampião aceitar a proposta de combate à Coluna Prestes. 
Virgulino é recebido em Juazeiro do Norte, como herói, e dá autógrafos. 
Lampião em 1936 quando recebeu a patente de capitão no Juazeiro no Norte apadrinhado por padre Cícero Romão Batista
O funcionário federal Pedro Uchoa de Albuquerque concede-lhe a patente de capitão e promete-lhe armas. Com a palavra empenhada ao vigário de Juazeiro do Norte, de abandonar o cangaço tão logo ponha fim à Coluna, volta para Pernambuco. É atacado pela polícia, bate em retirada. Não recebe armas, dinheiro nem o fardamento prometidos.

O bando está enfraquecido, posto que no confronto de Triunfo morreram Luís Pedro – lugar-tenente depois da morte de Levino -, Virgínio, Ezequiel, Mergulhão e Mariano.

Para despistar a polícia, espalha seus homens por Pernambuco, Alagoas, Bahia, Ceará, Sergipe e Rio Grande do Norte, os cinco estados juntos na caça ao cangaceiro. 

Ruínas da casa de dona Generosa, coiteira de Lampião, onde acontecia o Baile Perfumado
Estabelecido na Bahia nos anos 1928 e 1929, ordena um baile depois de efetivar um massacre no município de Queimados.

Constam do currículo de Lampião a morte de cinco mil pessoas, o incêndio de 500 propriedades, a morte de cinco mil reses, o estupro de 200 mulheres e 200 confrontos.

Com a Revolta Constitucionalista de São Paulo, o governo precisa de tropas. Para compensar, utiliza rádios em vilas e cidades. Sabendo da novidade, Lampião diz: “No dia que pegá um trem deste, o macaco que tivé com ele, tem que enguli tudo.”* Também perdia a calma quando ouvia falar em ônibus, porque o veículo podia transportar as volantes.

Em 1931, apaixonado por Maria Déia de Oliveira, a Maria Bonita, leva-a para o bando. Desde então, com o dinheiro acumulado, passa a ter costumes sofisticados; permite o uso do álcool pelos seus “cabras.” Para ele, conhaque Macieira ou uísque; para o estado-maior, Old Tom Gin; para os “cabras”, cachaça, genebra e quinado.

A vinda de Maria Bonita abre caminho para mais 38 mulheres cangaceiras. Distinguem-se Dadá, mulher de Gato, presa em Alagoas, em 1936; Luísa, mulher de Cabeleira; Ana do Bonfim, mãe de João do Bonfim e hábil no uso da peixeira; Lili, viúva de Lavandeira; Lídia, bonita, fogosa, mulher de Zé Bahiano; Sila, Nilda Ribeiro de Souza, raptada aos 14 anos por Zé Sereno; e Adília, mulher de Canário. Todas cangaceiras, dividindo tarefas com os homens, inclusive nos recontros, e tendo direitos iguais.

Antes de ser cercado pelas tropas chefiadas pelo coronel João Bezerra, Virgulino é celebrado na quadrinha: Lampião tem muita ideia/Sua vida está segura/Atirá nele é bobaje/A bala bate e não fura/A mulé de Lampião é danada pra luxá/Perfume de toda carta/Tem dentro de seu borná.

Lampião é morto com Maria Bonita e mais onze cabras. Em julho de 1938.

*Ranulfo Prata – Lampião

Postar um comentário

0 Comentários